terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Manoel da Conceição


Nascido em 24 de julho de 1934 na região de Pindaré Mirim, região norte do Maranhão, foz do Rio Tocantins. Filho de pequeno agricultor, expulso de suas terras por grileiros, aprendeu a ler sem freqüentar a escola, fez curso pelo MEB (Movimento de Educação de Base) ligado a igreja católica, onde conheceu Padre Alípio de Freitas. Em agosto de 1963 voltou para sua terra e fundou o primeiro sindicato de trabalhadores rurais do Maranhão, em tempos de liga camponesa liderada por Francisco Julião e em período de agitação política sob o governo de João Goulart. Depois do golpe militar, Manoel da Conceição se engajou na AP (Ação Popular).
No Maranhão, José Sarney assumia o governo do estado pela primeira vez em 1966, depois de derrotar a oligarquia de Vitorino Freire, que governava aquele estado por mais de 40 anos. Em 13 de julho de 1968, durante uma reunião na subsede do sindicato, em Anajá, a polícia chegou atirando, uma bala atingiu a perna direita de Manoel, que foi preso e depois de seis dias na cadeira sem tratamento, a perna teve que ser amputada. Sarney tentou “indenizar” Manoel, para ele ficar calado, ao que Manoel respondeu com uma frase famosa “Minha perna é minha classe”.
Em 1972 Manoel foi preso e levado a sede do I Exército no Rio de Janeiro, onde sofreu as mais terríveis torturas por sete meses. Em setembro de 1972 foi libertado graças a uma campanha feita pela AP e pela Anistia Internacional, foi para Fortaleza, onde foi julgado em 1975 e ficou mais três anos na cadeia e depois de libertado foi acolhido pelo então arcebispo de Fortaleza Dom Aloísio Lorscheider, então presidente da CNBB, que providenciou sua ida para São Paulo, onde foi internado para tratamento de saúde com a ajuda de Dom Evaristo Arns e o pastor Jaime Wright. Lá foi novamente preso, em 28 de outubro de 1975, levado para o DOI-CODI, as torturas somente foram interrompidas depois de um telegrama do papa João Paulo VI enviado ao general Ernesto Geisel e em maio de 1976 foi exilado em Genebra na Suíça, porém, antes de permanecer naquele país por mais de três anos, Manoel da Conceição esteve na China, numa missão articulada pela AP, fazendo cursos de guerrilha e de formação política.
Depois do exílio, com a anistia em 1979, Manoel da Conceição voltou para o Brasil, conheceu Paulo Freira e Lula, de quem se tornou amigo, assinou a ficha número três de fundação do PT, junto com outros personagens simbólicos como Mario Pedrosa, Sérgio Buarque de Holanda, Lélia Abramo, Apolônio de Carvalho, etc e responsável pela articulação do PT no nordeste foi candidato a governador pelo PT de Pernambuco em 1982, onde fundou o CENTRU (Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural) em Recife e Imperatriz (MA). Em 1985 mudou-se para Imperatriz (MA), onde vive até hoje.
Em Imperatriz se articulou com as lutas sindicais, das CEBs e do PT e no ano seguinte ocorreu o assassinato do Padre Josimo, seu amigo e companheiro de lutas, mas nada lhe intimidou a seguir adiante. Em 2000 elegeu o prefeito da cidade de Imperatriz, o companheiro Jolmar. O CENTRU passou a ser uma referência por onde passaram a maioria das lideranças políticas de esquerda do interior do Maranhão. Incansável em todas das batalhas, Manoel da Conceição, em 2010, ele viu o seu PT do Maranhão sofrer intervenção nacional para apoiar a oligarquia de Sarney, contra quem ele luta a meio século. Depois de muitas tentativas de diálogo, no dia 11 de junho de 2010, Manoel da Conceição e o deputado federal Domingos Dutra entraram em greve de fome, no plenário da Câmara dos Deputados em Brasília, contra a decisão do PT. Manoel resistiu seis dias e foi hospitalizado e no dia seguinte, foi aceito o acordo de que o PT indicaria o candidato a vice-governador de Roseane Sarney, mas os petistas estariam “liberados” para fazer campanha para outro candidato, no caso o concorrente Flavio Dino (PC do B), com quem Manoel e muitos petistas se engajaram, reelegendo Domingos Dutra deputado federal e Bira do Pindaré deputado estadual.
Já com 76 anos de idade e sempre engajado nas lutas, em 2011, Manoel da Conceição participou da fundação da tendência interna do PT, Militância Socialista, onde foi homenageado como “Presidente” de honra e depois desse período. Neste momento Manoel da Conceição vive em Imperatriz do Maranhão, acompanhado pela sua companheira Denise Leal, com quem tem uma filha Mariana e também acompanhado pelo filho do primeiro casamento, o professor Manoel Pinto Santos.
Conheci a história de Manoel da Conceição através da militância política no PT e no envolvimento militante pesquisando e lutando por dignidade e justiça dos ex-presos políticos e seus familiares, especialmente de Paulo Stuart Wright, que fora o deputado estadual catarinense cassado pela ditadura, desaparecido desde 03 de setembro de 1973. Fundamos o Instituto Paulo Stuart Wright (IPSW), em maio de 2003 e tive a alegria de encontrar pessoalmente Alípio de Freitas, Manoel da Conceição e tantos outros, que têm uma história que se cruza, nas lutas antes da ditadura, nas prisões, clandestinidades, exílio, fundação do PT e todos aqueles que não tombaram, continuam engajados e militantes até hoje, na certeza dos que tombaram estão com eles, dando força e esperança para continuar nessa luta, que não tem fim e cabe a nós continuá-la.
Como já houvera pisado o chão onde vive Alípio de Freitas, fui conhecer o chão onde vive Manoel da Conceição. Ambos expõem as seqüelas das torturas e da vida dura das lutas dos seus tempos. Manoel da Conceição parece acostumado com a perna mecânica que não lhe impediu de lutar quase meio século, mas se sente triste pela perda da memória, que começou depois da greve de fome e que parece desaparecer a cada dia. Apesar do esforço, não consegue se lembrar de muitas pessoas e contar suas histórias que sempre encantaram e mostraram o com o exemplo da sua vida, falando carinhosamente e com firmeza, o caminho da luta e os desafios de uma nova geração de lideranças que têm Manoel como líder, como educador, como guia. Manoel é uma espécie de Ghandi do sertão brasileiro, por onde passa e com quem se encontra deixa sua marca e o seu exemplo que ninguém consegue esquecer, tampouco calar diante das injustiças, por isso sempre que começa a falar, até hoje (isso não se apaga nunca da sua memória), que pode ser resumida, mais ou menos, na seguinte mensagem “nossa missão é lutar pelo empoderamento da classe trabalhadora, para deixar de ser explorada pelos grandes, nós temos capacidade de produzir nossa vida, nosso sustento e nossa soberania”.

(Consulta: FRANKLIN, A. Manoel da Conceição: lutador das liberdades da classe trabalhadora. Ed. Ética: Imperatriz (MA), 2009)